segunda-feira, 29 de novembro de 2010

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O NEGRO, O ALEIJADO E OUTROS "OBJETOS"

PAPER


Centro Universitário Nove de Julho – UNINOVE
Jornalismo – 8º semestre - Sala: 619 – Turno: Noturno
Disciplina: Seminários Avançados
Profº Valmir Costa - Avaliação - 3


RESUMO

Analisa-se no presente conteúdo textual as construções sociais, que perduram nas diferentes classes humanas até hoje.
A pesquisa estabelece dois pólos para desenvolver o estudo investigativo dos estigmas consolidados na sociedade: a identidade social e a identidade pessoal. A identidade social é aquela externalizada pelo indivíduo perante a coletividade, sendo que, os próprios agentes coletivos compactuam com a “fabricação” dessa identidade, ao estereotipar a pessoa pelo que ela diz e faz, como se as suas ações e aparência externa fossem em absoluto o que ela realmente é.
Por outro lado, a identidade pessoal é a consistência íntima do indivíduo, ou seja, o que ele de fato é, mas, a depender das circunstâncias e do estágio de evolução dele e da comunidade que faz parte, o seu verdadeiro eu, pode estar sendo reprimido.
No estudo das identidades, mencionam-se exemplos claros e contundentes dessa polaridade como o negro, o anão e o aleijado. Que na maioria das vezes, vivem na sociedade brasileira as duas identidades.

Palavras-chaves:
Identidade; verdadeiro eu; construção social; personagem;
autenticidade.


INTRODUÇÃO

Por intermédio desta pesquisa, busca-se um aprofundamento nas temáticas sociais: identidade social e identidade pessoal.
O autor do livro: Estigma, Erving Goffman, analisa essas duas identidades com um olhar crítico e metódico, para poder esclarecer os grandes paradoxos que envolvem as classes e grupos sociais.
O trabalho por hora em começo de explanação visa lançar luz sobre o pensamento do escritor para demonstrar com exemplos cada vez mais presentes e constantes a veracidade da constatação.
Nesse estudo das identidades pode-se perceber que a maior dificuldade dos humanos é aceitar o diferente, o qual por algum motivo demonstra inferioridade, no ponto de vista do observador e interlocutor.
O negro, por exemplo, sempre foi estigmatizado como um ser em desvantagem diante do branco, ou em algumas situações, levando- se em conta a possibilidade de ascenção social de um homem da pele escura, ele passava a ser visto como uma ameaça para um branco.
O aleijado quando não é alvo de sentimentos de compaixão -cujas demonstrações muitas vezes causam mais constrangimento que ajuda ao deficiente- é tratado como alguém que não tem preparo algum para exercer as funções de um homem normal, também não está habilitado para a tomada de decisões, e não pode freqüentar as festas que os demais cidadãos freqüentam, pois, geraria um incômodo tanto para os outros freqüentadores, como para os organizadores, além de mais gastos para os últimos, haja vista, que teria que promover a adaptação do ambiente para um segundo perfil de participantes.
São essas questões vigentes na sociedade que procuraremos entender com mais precisão, com o objetivo de encontrar e apresentar soluções para os dilemas que incomodam o convívio social, principalmente os mais atingidos pelos transtornos advindos do preconceito, mediocridade e desumanização dos agentes sociais.


METODOLOGIA

O trabalho é realizado tendo como base o livro do escritor Erving Goffman, intitulado: Estigma.
Disserta-se sobre a estigmatização “alimentada” pela sociedade, por meio de cinco tópicos: 1º- A identidade e o forjamento do eu; 2º – A dubiedade nos sentimentos; 3º – A capacidade profissional e a aparência; 4º – Alinhamentos intra e exogrupais; e 5º - Estigma e realidade.
Os tópicos são desenvolvidos sistematicamente em harmonia com alguns exemplos já estabelecidos, e que perduram na atualidade: o negro, o anão, o aleijado, que são, no ponto de vista dos normais, pessoas que não podem ser tratados como se não fossem o que são: o negro, pele escura, com excesso de melanina, o anão, pessoa de pequeníssima estatura, e o aleijado, um homem incapaz de viver como os demais, por causa de suas limitações físicas.
Na análise, o foco é fazer o desdobramento dessas situações e apontar soluções para os constrangimentos e sofrimentos causados, pelas construções sociais.


TÓPICO 1 – A IDENTIDADE E O FORJAMENTO DO EU

As identidades sociais e pessoais, segundo o escritor Erving Goffman, são parte, antes de qualquer coisa, dos interesses e definições de outras pessoas em relação ao indivíduo cuja identidade está em questão. No caso da identidade pessoal, esses interesses e definições podem surgir antes mesmo de o indivíduo nascer e continuam depois dele haver sido enterrado, existindo, então, em épocas em que o próprio indivíduo não pode ter nenhuma sensação inclusive as sensações de identidade. Por outro lado, a identidade do eu é, sobretudo, uma questão subjetiva e reflexiva que deve necessariamente ser experimentada pelo indivíduo cuja identidade está em jogo. Assim, quando um criminoso usa um pseudônimo, está-se afastando totalmente de sua identidade pessoal; quando mantém as iniciais originais ou algum outro aspecto de seu nome original, está, ao mesmo tempo, favorecendo um sentido de sua identidade do eu. É claro que o indivíduo constrói a imagem que tem de si próprio a partir do mesmo material do qual as outras pessoas já construíram a sua identificação pessoal e social, mas ele tem uma considerável liberdade em relação àquilo que elabora.
O conceito de identidade social nos permitiu considerar a estigmatização. O de identidade pessoal nos permitiu considerar o papel do controle de informação na manipulação do estigma. A idéia de identidade do eu nos permite considerar o que o indivíduo pode experimentar a respeito do estigma e sua manipulação, e nos leva a dar atenção especial a informação que ele recebe quanto a essas questões.
A verdadeira identidade do eu é por evidência científica o eu em sua essência, sem subterfúgio, sem “maquiagem”. A autenticidade do eu se demonstra, prioritariamente, em momentos de confidencialidade pessoal.
O forjamento do eu nada mais é que uma “fabricação” da personalidade de um indivíduo de acordo com a forma como a sociedade o pensa e o vê, e não se pode ignorar que o próprio indivíduo contribui para a construção dessa imagem pela pelas maneiras de comportamento adotadas por ele no convívio social, com o intuito de agradar, na maioria das vezes, seu grupo com o qual ele supostamente se identifica, ou por questão de conveniência pretende pertencer, ainda que seja por apenas um período.
O que acontece em muitos casos é a um desfecho histórico infeliz de muitos agentes sociais, que não tiveram a necessária coragem para se posicionarem na comunidade da qual fazem parte, como realmente gostariam de fazê-lo, sem assumirem uma personagem para agradar quem quer que seja, sendo pessoas dotadas de todos os atributos humanos, assim como os demais seres, pessoas munidas de virtudes e defeitos, mas que se relacionam social, pessoal, profissional e sexualmente, da forma que lhes agrada, em harmonia com sua visão de mundo, sem, todavia, ter a intenção de ferir a personalidade ou o orgulho de alguém, mas, também sem querer viver uma vida de ilusão, fundamentada em personagens que são incorporados de acordo com as conveniências sociais.


TÓPICO 2 – A DUBIEDADE NOS SENTIMENTOS

Na sociedade brasileira, que, diga-se de passagem, tem deixado muito a desejar, com relação ao desenvolvimento humano, as pessoas que compõem a coletividade, sentem-se em muitas situações cotidianas, obrigadas a viver sentimentos paradoxais, por conta da aparente e, em muitos casos, reais necessidades de adequação aos modelos sociais previamente construídos e transportados de geração a geração.
Por causa desse tipo de acontecimento nas diversas culturas, muitos agentes sociais, encaram uma realidade infeliz de ambivalência, alimentam o amor e o ódio ao mesmo tempo.
São condicionadas a uma situação que aprenderam ser a certa, ser digna de um bom cidadão, mas, em contrapartida, acreditam que poderiam ser diferentes, não precisavam seguir os paradigmas dos antepassados. Cobram em silêncio e cultivando uma profunda aversão, uma personalidade que poderia ser mais interessante, a adoção de comportamentos que poderiam proporcionar mais satisfação e o completo sentimento de realização pessoal e profissional.
Na percepção do teórico Goffman, o indivíduo estigmatizado, em muitos casos, prefere se distanciar dos demais que também são estigmatizados na sociedade, só que de uma forma mais acentuada. Ao tentar fugir do estigma, por meio da auto-exclusão grupal, ele procura ter uma compreensão mais aprofundada da realidade dos seus iguais e, em alguns casos até mesmo busca soluções para os problemas.
Ele não se conforma com o tratamento dispensado pela sociedade para ele e seus iguais, não considera correta a estigmatização, ou pelo menos em quanto ser humano único e pensante e diante da percepção clara da situação dos estigmatizados, ele pensa em uma não adequação aos espaços sociais estabelecidos para os estigmatizados. Só que ao agir dessa forma, acredita-se que ele só agrava a situação, posto não querer aceitar a realidade, como ela de fato é, e, sua revolta, é um dos motivos que propiciam maior visibilidade sobre os problemas dos estigmatizados, ou pelo menos os coloca em evidência dentro de suas congênitas limitações.
Pode-se constatar esse sentimento de rejeição grupal, e retratação mediante uma melhor compreensão do panorama geral dos estigmatizados e da individualidade do ser, por meio do exemplo de uma garota cega, que faz sua explanação do problema:

"Uma vez - há alguns anos - pensei que preferia sair com um homem que enxergasse do que com um homem cego. Mas eu de vez em quando saía com rapazes e aos poucos meus sentimentos foram mudando. Valorizo o sentimento que o cego tem em relação a outro cego e posso, agora, respeitar um homem cego por suas próprias qualidades e sentir-me feliz com a compreensão que ele pode me dar."
"Alguns de meus amigos são cegos, outros, não. Isto, de certo modo, me parece ser o caminho correto - não posso compreender que as relações humanas sejam governadas por uma dessas possibilidades."


TÓPICO 3 – A CAPACIDADE PROFISSIONAL E A APARÊNCIA

Sugeriu-se que o indivíduo estigmatizado se define como não-diferente de qualquer outro ser humano, embora ao mesmo tempo ele e as pessoas próximas o definam como alguém marginalizado. Dada essa autocontradição básica do indivíduo estigmatizado, é compreensível que ele se esforce para descobrir uma doutrina que forneça um sentido consistente à sua situação. Na sociedade contemporânea, isso significa que o indivíduo não só tentará, por conta própria, elaborar tal código, mas que, como já foi sugerido, os profissionais o ajudarão - algumas vezes com o pretexto de fazê-lo contar sua história de vida ou de contar como se saíram de uma situação difícil. Como aconteceu na novela global “Viver a Vida” da autoria do escritor Manoel Carlos, no final de cada capítulo uma pessoa aparecia para contar sua história de sofrimento por causa de alguma limitação e subseqüente superação ou pelo menos, amenização do problema.
Para Goffman, os códigos apresentados ao indivíduo estigmatizado, quer explícita ou implicitamente, tendem a cobrir certas questões-padrão. Um modelo desejável de revelação e ocultamento é oferecido ao estigmatizado.
Ele precisa se comportar socialmente como se possuísse a deficiência, mas soubesse se relacionar com os normais com total naturalidade, de maneira que sua condição de indivíduo possuidor de algum tipo de limitação não causasse constrangimento algum para os normais.
Todavia, sabe-se que apesar do estabelecimento dos códigos de comportamento, as relações humanas se desencadeiam de acordo com as conveniências. É conveniente para um normal dito, ou pelo menos considerado “superior”, tratar um estigmatizado como se fosse um dos seus, enquanto essa situação não for de alguma forma exercida sob pressão, e enquanto não for quase insuportável para os normais serem cúmplices dos estigmatizados nessa forma de conduta nas relações interpessoais.
A capacidade profissional do indivíduo é dimensionada por sua aparência, têm-se exemplos óbvios na sociedade brasileira. O anão não está, no ponto de vista dos de alta ou normal estatura, habilitados para exercer uma função, por causa de sua visível desvantagem no crescimento. O negro não pode ser admitido para uma atividade de destaque por causa do excesso de melanina em sua pele. Isso acontece devido ao fato de ter-se estabelecido construções sociais nas comunidades humanas, as quais foram se consolidando com o tempo. Um cidadão negro para assumir a atividade que supostamente só poderia ser efetuada por um branco tem que estudar duas ou mais vezes os conteúdos programáticos estudados pelos brancos.
O aleijado é outro exemplo de estigmatização na sociedade. Ele, na visão dos normais, não pode, em hipótese alguma, desenvolver uma atividade com a mesma desenvoltura dos não deficientes, posto não ter os mecanismos disponíveis como os normais para a efetivação das funções do ofício.
Desta forma, se consolida espaços específicos para grupos dentro de um mesmo âmbito social. Sabe-se, por outro lado, que a condição física de uma pessoa, sua estatura, sua cor de pele e suas limitações de locomoção, não são razões suficientes para a exclusão social. Na verdade, como já se cogitou e até mesmo comentou a necessidade maior é de um a ajuda para os normais que não conseguem se relacionar de uma forma ética e humana com os que sofrem de um determinado estigma.
No depoimento abaixo se pode perceber mais alguns exemplos de construções sociais para determinados grupos de pessoas:

“Aprendi também que o aleijado deve ter cuidado em não agir de maneira diferente da expectativa das pessoas. Acima de tudo, eles esperam que o aleijado seja aleijado; seja incapacitado e indefeso: inferior a eles e, assim, têm desconfiança e sentem-se inseguros se os aleijados não correspondem a essas expectativas. É bastante estranho, mas o aleijado tem de desempenhar o papel de aleijado, assim como as mulheres têm que ser o que os homens esperam delas, ou seja, simplesmente mulheres; e os negros freqüentemente têm que agir como palhaços frente à raça branca "superior", de tal modo que o homem branco não fique amedrontado por seu irmão negro.



Tópico 4 – ALINHAMENTOS INTRA E EXOGRUPAIS

Goffman afirma que, embora essas filosofias de vida propostas, essas receitas de ser, sejam apresentadas como resultantes do ponto de vista pessoal do indivíduo estigmatizado, a análise mostra que algo mais as informa. Esse algo mais são os grupos, no sentido amplo de pessoas situadas numa posição semelhante, e isso é a única coisa que se pode esperar, já que o que um indivíduo é, ou poderia ser, deriva do lugar que ocupam os seus iguais na estrutura social.
Um desses grupos é o agregado formado pelos companheiros de sofrimento do indivíduo. Os arautos desse grupo sustentam que o grupo real do indivíduo, o grupo a que ele pertence naturalmente, é esse. Todas as outras categorias e grupos aos quais o indivíduo também pertence necessariamente são, de modo implícito, concedidos como não verdadeiros; ele, na realidade, não é um deles.
Na tentativa de se auto-afirmarem enquanto agentes sociais participantes dos fatos inerentes aos cidadãos que compõem uma nação, os estigmatizados se adéquam á um grupo de iguais. O objetivo principal em muitos casos, depois da identificação, é a busca do cumprimento das leis constitucionais a favor de todos os cidadãos civis independentemente das circunstâncias que os cercam. Acreditam no reconhecimento dos estigmatizados pelos normais por intermédio da formação de um grupo forte de pessoas marginalizadas, ainda que de maneira camuflada, como sempre aconteceu com o negro brasileiro.
Há aqueles que acreditam não haver fundamento lógico para o pertencimento a um grupo específico dentro do espaço social, mesmo por que na sua forma de entender as relações sociais, a criação e consolidação grupal, só fazem acentuar a condição do estigmatizado como tal. Então não seria a solução essa separação dentro da sociedade, ainda que aparentemente bem intencionada.
Para o indivíduo que discorda da relevância na formação grupal de pessoas com semelhanças que as enquadram como estigmatizadas, o ideal seria a absoluta interação entre todos os cidadãos dentro da sociedade, como se não existisse barreira alguma entre eles. Se um deficiente consegue realizar, a despeito de suas limitações, as mesmas atividades de um normal, não há motivo para a sua exclusão, e ele não deveria se sentir inferior aos demais nem se permitir a autocomiseração.
Por outro lado, sabe-se que apesar dos esforços de muitos indivíduos para superar suas limitações, e mesmo com o aparente desejo dos normais em demonstrar interesse nas relações sociais com os portadores de determinadas deficiências, essas relações em sua grande maioria são pautadas por conveniências. Enquanto for conveniente para um normal, tratar um aleijado como se não o fosse, ele o tratará dessa forma, enquanto essa relação não for desgastante ou sacrificante para os normais, eles a manterão.
Como pode ser observado, a questão poder ser analisada sob vários ângulos.
Segue-se um depoimento de um estigmatizado, não satisfeito com o estigma, e que procura mostrar a ilogicidade das construções na sociedade:

Quem disse que os aleijados são infelizes? Eles ou vocês? Só porque eles não podem dançar? Toda música pára, em algum momento. Só porque eles não podem jogar tênis? Muitas vezes o sol está muito quente! Só porque têm que ser ajudados a subir e descer escadas? Você preferia fazer outra coisa? A poliomielite não é triste, ela é só um grande inconveniente, o que significa que você não pode ter acessos de mau humor e correr para dentro do quarto e bater a porta com um pontapé. Aleijados é uma palavra horrível. Ela especifica! Coloca de lado! É muito íntima! Condescendente! Dá-me vontade de vomitar como uma criatura que serpenteia para fora do casulo.


TÓPICO 5 – ESTIGMA E REALIDADE

O estigma social figura como comportamentos intra e exogrupais, cujo intuito é a conquista da aceitação pela coletividade. Nessa perseguição de objetivo, na fuga do isolamento, o indivíduo em muitos casos foge absolutamente do seu verdadeiro eu. O homossexual não assume sua homossexualidade, a lésbica se casa com uma pessoa do sexo oposto e dá à luz a filhos, mesmo tendo o desejo oculto de ter atitudes de homem.
Ela vive uma vida que sente não ser a dela, ou a que ela gostaria de estar vivendo. Torna-se uma pessoa infeliz, em muitos casos, o que depende muito do equilíbrio de cada pessoa: ela se demonstra satisfeita com a vida e procura agradar as pessoas com as quais se relaciona no dia-a-dia, não deixa transparecer, pelo menos quando está acompanhada, o seu sofrimento e frustração interiores, por conta da personagem que interpreta constantemente.
Analisando a situação por outro ângulo, uma nova questão se ergue em meio ao dilema: se a homossexualidade feminina ou masculina passa a ser encarada pelo indivíduo que a vive, com total naturalidade, e ele assume seu novo comportamento sexual sem aparente constrangimento, será que seu verdadeiro eu está sendo vivido ou ele continua distante da autenticidade? Será que ele não está na verdade fugindo do seu eu que ainda não tinha sido bem definido, ou plenamente descoberto? A questão é bastante subjetiva, mas pode-se pensar na essencialidade do auto-descobrimento pelo próprio indivíduo e a busca de uma total libertação, enquanto ser único e insubstituível na composição de personalidade.
Independente dos conceitos e preconceitos sociais é fundamental que cada pessoa se encontre como personalidade totalizante, e viva sua própria realidade.
Acredita-se que a plenitude da vida não consiste em teorias, padrões de conduta -que na maioria das vezes só servem como instrumentos de manipulação para a manutenção das ideologias dos abastados dominantes- mas na descoberta do verdadeiro eu, pelo próprio indivíduo em estudo, principal agente dos fatos.
Erving assevera que na verdade, tanto o papel do estigmatizado como do normal não são determinantes para classificar uma pessoa como realmente participante de um ou de outro grupo. Pois tanto o estigmatizado como o normal a depender das circunstâncias podem assumir com maestria ambos os papéis.
O homossexual pode se passar por um hetero como de fato acontece constantemente na sociedade brasileira. O honrado homem casado, marido da honrada e estimada mulher, srª... E pai de lindos e promissores filhos, contrata garotos de programa para satisfazer seus desejos ocultos que ele não quer mais reprimir, mas, por outro lado, acredita que não vale a pena manifestá-los publicamente.
O que é mais raro, todavia, não impossível é o hétero que por algum motivo assume o comportamento do homossexual. Talvez por curiosidade, ou por fetiche, mas, seria válido saber até onde o fetiche não pode ser imputado como um desejo já alicerçado e buscado para o cotidiano.
O negro que não é palhaço e sabe qual é sua função na sociedade como cidadão, se permite passar por bobo da corte para ser aceito ou até mesmo não ser considerado como uma ameaça para seus “irmãos” brancos.
O anão que se sente discriminado por causa do pequeno tamanho físico, mas, que reconhece o seu valor e sua contribuição na sociedade, ele que é detentor de inteligência e talento, se permite viver ainda que, somente nos espaços públicos, como o engraçadinho, o motivo de zombaria.
Por causa da absorção e permanente estabelecimento dos estigmas, pode-se constatar que na maioria dos casos, tanto os estigmatizados como os normais, vivem uma ilusão. Enganam e são enganados, por falta de um suficiente respeito pelo outro independente das diferenças físicas, ideológicas ou sociais.


CONCLUSÃO

O estudo sobre o tema: estigma traz para a atualidade questões que sempre perduraram em maior ou menor proporção na sociedade, no decorrer do tempo.
Sempre houve discriminação, preconceito e falta de nobreza e generosidade suficientes para aceitar completamente o outro, o diferente. O outro que, apesar das diferenças não deixa de fazer parte da mesma história da época, muitas vezes, por mais incrível que possa parecer, com maior expressividade que os “notáveis” normais.
Um fato que causa bastante preocupação é a discriminação exercida pelo estigmatizado contra os demais estigmatizados, pessoas que vivem a mesma realidade.
O preconceituoso que age dessa forma tem na verdade mais um problema a ser superado, além de precisar superar suas possíveis limitações de forma cabal ou quase absoluta, ele precisa se despojar da introjeção psicológica de que afirma não convir se agregar aos menores aos menos favorecidos, enfim, aos estigmatizados. Ele abstraiu um pensamento que consiste na procura pela exclusão do enquadramento a um grupo específico, mas, certamente ele próprio não aceita sua realidade e intenciona se aproximar dos normais com plena naturalidade como se entre eles não houvesse nenhum obstáculo.
A superação pelos estigmatizados em todos os aspectos da vida sejam pessoais, sentimentais e profissionais, é louvável, entretanto, é fundamental que o estigmatizado preconceituoso reveja seus conceitos com relação à condição social de seus iguais e sua própria condição enquanto parte involuntária desse grupo.
Apesar de todos os impasses existentes nas relações, e de todas as incorporações de personagens para satisfazer desejos e conveniências, pode-se pensar em um convívio minimamente tolerável, pautado pelo respeito e pela ética, essenciais em todas as relações humanas.

Referência Bibliográfica:

GOFFMAN, Erving: Estigma.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Última parada 174

Análise do filme-documentário: "Última parada 174"



Material analisado em três diferentes tópicos:

1º) A perceptividade da pobreza e o espetáculo;
2º) A condição do menor carente e o espetáculo;
3º) Vida carcerária, crime (inclusive o seqüestro)
e o espetáculo.


Discussão do primeiro tópico:

A perceptividade da pobreza e o espetáculo:

A pobreza é considerada na sociedade brasileira, como falta de capacidade, sinônimo de violência, e, por conseguinte, uma condição de inferioridade. Atribui-se a essa situação, a falta de empenho no estudo e ausência de perseverança na busca por uma oportunidade de trabalho mais favorável.
Desta forma, a classe desfavorecida economicamente, dentro de uma sociedade capitalista (cujo foco primordial em todas as relações interpessoais é o poder aquisitivo), na maioria das vezes, não tem nenhuma relevância. Se uma pessoa mora no subúrbio, no ponto de vista dos bem nascidos, não tem dignidade suficiente para figurar entre os moradores dos bairros nobres.
A classe pobre só aparece na mídia em momentos propícios para o show do sensacionalismo. Assim sendo, se reafirma a precária condição dos moradores dos morros, por meio da espetacularização dos fatos que chocam a sociedade. Os mentores do espetáculo, donos e funcionários dos veículos de comunicação, não estão interessados na busca de uma providência do governo, mas, pelo contrário, querem na verdade, acentuar a delimitação das posições sociais dos indivíduos e lucrar com os índices de audiência dos programas televisivos.
Não há uma análise crítica com relação aos fatos que desencadeiam os assaltos, seqüestros, estupros e assassinatos, haja visto que o alvo dos meios de comunicação é a exploração das tragédias como uma forma de lucratividade e acentuação do abismo entre as classes.


Discussão do segundo tópico:

A condição do menor carente e o espetáculo:

A situação na qual vivem os menores abandonados no Brasil é de absoluta calamidade. O seqüestro do ônibus 174 no Rio de Janeiro no dia 12 de junho de 2000, no bairro do Jardim Botânico, por Sandro Barbosa do Nascimento, é uma demonstração clara do descaso das autoridades governamentais com a vida das crianças carentes do país e do futuro delas, pelo fato de não possuirem um suporte familiar para receberem uma formação pelo menos básica.
O Sandro que tinha vivenciado a chacina da Candelária nas dependências da Igreja de mesmo nome, na madrugada de 23 de julho de 1993, deixando mortos e feridos, volta agora para fazer vítima, pois ele não quer mais sê-lo.
Não se pode justificar o seqüestro do ônibus pelo bandido, muito menos o assassinato de Geísa Firmo Gonçalves, como forma justa do revide de uma pessoa que teve uma infância problemática. Mas, também não se deve negar a falta de responsabilidade e investimento dos governos: federal, estadual e municipal nos menores carentes, que não tem estrutura social alguma, e sobrevivem totalmente vulneráveis a todo tipo de influência e degradação física e moral, sem sentimento algum de valorização enquanto seres humanos e muito menos enquanto cidadãos brasileiros.
A triste realidade é que a mídia não aparece para conhecer profundamente e denunciar a negligência das autoridades competentes, ela se apresenta para vender seus produtos ideológicos, que são os programas sensacionalistas, revistas e jornais, com foco na lucratividade e alienação dos leitores e telespectadores.
Quando a situação dos menores carentes é exibida, a intenção dos produtores dos programas televisivos é ganhar audiência, ou dar a oportunidade para alguma celebridade se destacar ainda mais, mediante uma ação que tenha realizado em favor dos menores, que, muitas vezes, serve apenas como um pequeno paliativo. A ação do “generoso” mesmo sendo continuada é insuficiente para resolver os problemas das crianças sem-teto do país.
Ao invés de servir de espetáculo, o caos no qual os menores vivem, deveria servir de pauta para investigações, com um direcionamento irrestritamente voltado para a cobrança de iniciativas do poder público, e subseqüente resolução dos problemas.


Discussão do terceiro tópico:

Vida carcerária, crime (inclusive o seqüestro) e o espetáculo:

Crime e seqüestro:

A criminalidade é o reflexo da falta de estrutura social e familiar dos delinqüentes.
Acredita-se que, se houvesse justiça social, igualdade na distribuição de oportunidade de emprego e de renda, por meio de um adequado investimento em escolas, saúde pública, construção de casas sociais, maior policiamento, menos corrupção, abertura de novas frentes de emprego, certamente o índice de violência não seria o mesmo.
O seqüestro, assim como outros atos de violência, é uma reação à diferença que existe entre as classes. Diferença com relação à dignidade como cidadão, oportunidade de ascensão social, visibilidade enquanto ser humano pensante e merecedor de respeito e atendimento das necessidades essenciais: boa moradia, salário adequado e serviço público eficiente.


Vida carcerária:

A realidade dos cárceres no Brasil é um exemplo categórico do descuido e fabricação em série de bandidos.
Os prisioneiros ficam ociosos, pois não tem um processo de qualificação e requalificação profissional, e não se oferece um curso minimamente profissionalizante para a colocação ou recolocação do ex-detento no mercado de trabalho.
Nas penitenciárias do país, poderia existir uma infra-estrutura apropriada, que garantisse ao preso, ter a possibilidade de “remissão”, ou seja, cumprir a pena, no mesmo tempo que alcança o crescimento pessoal, intelectual e profissional, enfim, tornar-se um indivíduo capaz de fazer parte da coletividade.
Os detentos ficam em um constante estado de inércia arquitetando mais ações criminosas, sofrem a influência de companheiros de sela mais perigosos, e saem dos presídios em uma situação de total perda enquanto ser pensante e apto para um bom convívio social.
Se pudessem estudar e trabalhar, além da descoberta de uma nova forma de vida pautada pela ética e pela responsabilidade enquanto ser provedor, eles teriam possibilidade de ressarcir o dinheiro público que é aplicado nas penitenciárias.


O espetáculo:

Pela deficiência do sistema penitenciário, os condenados pioram cada vez mais, e, quando aparecem na mídia são personagens do espetáculo promovido pelos próprios produtores dos programas midiáticos, tanto de entretenimento como informativos.
Os fatos que amedrontam a população cotidianamente são apresentados de forma circense. Estes são momentos nos quais os meios de comunicação, cinicamente, transformam a realidade em espetáculo, para única e exclusivamente atingirem grande audiência e, por conseguinte, aumentarem as cifras das contas bancárias dos donos da imprensa nacional.