sexta-feira, 17 de setembro de 2010

O Samba como Produto da Indústria Fonográfica

PAPER

Palavras-chaves:
Fabricação; higienização; recursos técnicos; deculturação; samba; modernização.


Magno Viana dos Santos, estudante do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Nove de Julho-Uninove – Campus Memorial -Barra Funda - São Paulo-SP - Ano 2010.

RESUMO

Pesquisa-se neste trabalho a indústria cultural, cultura popular, história da música brasileira e do samba, e, da indústria fonográfica no Brasil, na defesa da seguinte tese: “O samba foi transformado em produto da indústria fonográfica a partir da década de 1920”. Descreve-se a influência da cultura européia sobre a brasileira, a consolidação do samba no Rio de Janeiro, e, comprova-se a tese mostrando como a indústria fonográfica, a partir da década de 20, transformou o samba em produto, posto que, nesta época a indústria do som passou pela substituição da forma mecânica de reprodução musical pela forma de gravações elétricas e, ao mesmo tempo, aconteceu a modernização do samba com a criação dos subgêneros, arranjos técnicos e fabricação em série de discos com foco exclusivamente voltado para a comercialização da música.




INTRODUÇÃO

Por intermédio desta pesquisa procura-se provar que o samba, manifestação da cultura brasileira, foi transformado em produto da indústria fonográfica a partir da década de 1920, um período no qual houve uma grande evolução na indústria fonográfica, posto que, a forma mecânica de produção e reprodução de disco, foi substituída pela forma elétrica. Esse momento foi emblemático na história da indústria fonográfica no Brasil. Simultaneamente, acontece uma transformação profunda no samba, pois, componentes dos blocos carnavalescos dos Bairros do Estácio de Sá e Osvaldo Cruz, e dos morros da Mangueira, Salgueiro e São Carlos, adquiriram características modernas, o samba passou por um processo de higienização, ficou elitizado, enfim, o foco não estava mais em um samba de raiz, que é um samba executado sem os recursos tecnológicos.
De 1920 em diante apareceriam sambistas como: Paulinho da Viola, Ismael Silva, Ari Barroso, Wilson Batista, Zé Kéti, Noel Rosa, Nelson Cavaquinho, entre outros artistas, que fariam parte de uma nova leva de músicos do samba, com um perfil mercantilizado, produzindo um samba diferente, permeado por diversas modificações, e subgêneros, sendo exibido maciçamente nos grandes palcos urbanos, nas rádios e na televisão.
Toda a análise desse trabalho é pautada pela busca de evidências das principais alterações sofridas por esse estilo musical. O samba que tem sua origem como gênero, a partir de suas execuções no Rio de Janeiro, foi alvo no início de sua história, de muito preconceito, depois, mediante algumas alterações e adaptações, ele foi introduzido na classe média. Em 1920, ocorrem algumas mudanças que, definitivamente, apontam uma nova fase no estilo.




METODOLOGIA

O trabalho de pesquisa é elaborado com base em obras bibliográficas de especialistas nos assuntos: indústria cultura, cultura popular, música brasileira, gênero samba e indústria fonográfica.
No primeiro capítulo conceitua-se a indústria cultural e a cultura popular, no segundo, se reporta uma visão panorâmica da história da música brasileira, sua origem e principais características, no terceiro, existe a descrição da história do samba, seu surgimento, preconceito sofrido, vias de propagação, aceitação pela classe média carioca, consolidação como gênero musical, especificamente carioca e, transformações advindas da utilização dos recursos técnicos, e, finalizando, traça-se um perfil da história da indústria fonográfica no Brasil, bases para implantação, perfil, crescimento, características, modernização e como sua existência e, principalmente, evolução contribuíram para fazer do samba uma forma de manifestação da cultura brasileira diferente da que era exibida antes da década de 1920.



CAPÍTULO 1–INDÚSTRIA CULTURAL E CULTURA POPULAR

1.1 –Indústria cultural
Pode-se definir o termo indústria cultural como um tipo específico de cultura fabricada pela classe dominante da sociedade. Não é uma cultura que desperte no espectador uma curiosidade ou inquietação, que o faça refletir profundamente como pessoa, como agente social dentro de um determinado contexto histórico. Muito pelo contrário, a indústria cultural ou cultura industrializada, na verdade condiciona as pessoas a uma situação de alienação parcial ou até mesmo total. Com uma forma de cultura barata, despojada de áurea, que é, diga-se de passagem, indispensável a qualquer forma genuína de cultura, a sociedade (quando falo sociedade obviamente me refiro às classes majoritárias em número e infelizmente, menos favorecidas economicamente falando) fica obscurecida, sem nenhum senso crítico, apenas compra as ideologias da classe dominante que é composta pela elite, os mais favorecidos.
O trágico da indústria cultural é que as pessoas em geral que se deixam envolver por uma idéia de felicidade, por meio do consumismo, da compra desenfreada de mercadorias e de “obras culturais”, não atentam para a possibilidade de uma reformulação social mediante a busca do conhecimento e o questionamento da forma de vida estereotipada e acomodada que levam.
Em âmbito internacional a indústria cultural também exerce enorme influência e, só para ressaltar, é nessa esfera que tudo se origina. Os países do Primeiro Mundo, que são por sua vez, Estados Unidos, Japão, Alemanha, Inglaterra, etc. são países que estão na linha de frente como desenvolvidos e vendem suas ideologias para os países do Segundo e Terceiro Mundo, socialistas e subdesenvolvidos respectivamente.
Essa manipulação orquestrada pelos países do Primeiro Mundo sobre os do Segundo e Terceiro está imbuída em uma concepção perversa que defende os países ricos como capacitados exclusivamente para pautar e condicionar a forma de vida dos demais países. De forma sutil ou explícita as maneiras comportamentais das mais banais como modelos de vestimentas, opções de entretenimento como desenhos animados até as mais necessárias como comidas (não gostos alimentares específicos, que atendem mais a um ritualismo e modismos) e gestualidades importantes, mas, não fundamentais como hábitos sociais, etc. São copiadas pelos países do Segundo e Terceiro Mundo, com o intuito de se aproximarem das regras adotadas pelos países ricos.
A indústria cultural efetua uma função sem a qual a fabricação em série e exportação de mercadorias e traços específicos de determinadas sociedades não aconteceriam. Mediante esse instrumento chamado indústria cultural, que é um conceito bem notável em toda sociedade capitalista, tudo se torna mais fácil e super rápido. A idéia de realização de sonho, por meio dos produtos advindos das fábricas, sem o despertar para uma análise séria e aprofundada dos humanos, enquanto seres pensantes se torna vendável e absolutamente aceitável. Assim a cultura industrializada se consolida e o homem se desumaniza na mesma proporção.
O professor e escritor José Teixeira Coelho Netto, (NETTO, 2003: P.8), afirma que a indústria cultural surgiu primordialmente no século XV, com a invenção dos tipos móveis de imprensa, feita por Gutenberg.
Mas, ele observa que em um primeiro momento, apesar de o meio inventado reproduzir ilimitadamente os textos da época, o consumo era restrito a uma elite de pessoas cultas, sendo assim, a cultura de massa, que é “fruto” da indústria cultural, não passou a existir de imediato. Pois, só uma minoria da sociedade tinha acesso aos conteúdos literários.
A indústria cultural aparece com os primeiros jornais, mas a cultura de massa, para existir, além deles exigiu a presença, neles, de produtos, que alcançariam a grande maioria da sociedade como o romance de folhetim – que propagava em episódios ou capítulos, e para um público extremamente amplo, uma arte fácil e, por conseguinte de mínima qualidade, que se servia de recursos simplificados para ilustrar a maneira como as pessoas viviam na época. Não se buscava uma forma de arte rebuscada, bem trabalhada com o objetivo de aprimorar a existência humana, uma arte que impulsionasse nas pessoas um desejo de aperfeiçoamento como pessoas, profissionais, enfim, espectadores e personagens dos acontecimentos históricos.
A indústria cultural, por meio da massificação da cultura, comercializa produtos que não são feitos por aqueles que os consomem. Fabrica-se, por exemplo, o artista que para a presente análise pode se tratar de um aspirante à posição de músico. Após a fabricação deste, por meio dos recursos técnicos e as mais variadas formas de marketing como divulgação em rádio, TV, revista, jornais, outdoor, etc., parte-se para a mercantilização de sua obra que podem ser CDs, DVDs, entre outras mercadorias. Desta forma, ele ganha projeção no meio artístico e grande visibilidade perante a sociedade, transformando-se aos olhos da população (ficando essa subentendida como a massa da sociedade) em ídolo, celebridade, ou até mesmo ícone da música sertaneja, pop, samba, reggae, etc.
Todavia, segundo alguns especialistas no assunto, não se poderia falar no conceito indústria cultural num período anterior ao da Revolução Industrial, que ocorreu no século XVIII. Ainda afirmam que muito embora a Revolução tenha sido uma causa básica para o surgimento da indústria cultural, na verdade o que vai consolidá-la será uma sociedade alicerçada na economia, ou seja, um tipo de sociedade que prima por bens de consumo, alimentando assim a fabricação em série dos produtos da indústria cultural.
José Teixeira Coelho Netto (2003: P. 13), disserta sobre a indústria cultural, caracterizando-a como: “revolução industrial, capitalismo liberal, economia de mercado e sociedade de consumo.”
O romeno Carl Grüenberg, professor de economia política, em seu discurso proferido no auditório da Universidade de Frankfurt (Grüenberg, Festrede [Discurso original], 8 sg.) (Apud WIGGERSHAUS, 2002: PP. 56-57) faz um comentário sobre dois grupos sociais, os pessimistas e os otimistas, que podem ser pessoas tanto especialistas como curiosas com relação às mudanças culturais.
No ponto de vista de Grüenberg, o conceito de indústria cultural, que é considerado em linhas gerais como a perda do brilho pela cultura, e as modificações na cultura popular mediante os recursos tecnológicos são temas de debates entre analistas pessimistas e otimistas. Para o primeiro grupo a cultura foi trágica e totalmente deteriorada pelo homem, entenda-se homem, aqueles agentes sociais que detêm o poder de influência devido ao poder aquisitivo que possuem. Por outro lado, para o segundo, a cultura tem, simplesmente, passado por um desencadear de aprimoramento e que na forma deles de pensar, inclusive esse processo de aperfeiçoamento deve ser acentuado. Acreditam que a sociedade unanimemente deve promover de forma sempre “progressiva” as transformações nas formas culturais.
Para esclarecer ainda mais o assunto ou porque não dizer a problemática que permeia o conceito indústria cultural, é bastante pertinente a referência que Wiggershaus (2002: p. 111) faz do revolucionário russo, doutor em ciências políticas Georg Lukács na qual ele diz que Lukács objetivou libertar os artistas do foco obcecado na venda de suas obras, ele primava pela libertação dos autores e, por uma vida para eles direcionada exclusivamente para o enriquecimento cultural, que não houvesse ambição por dinheiro, mas que se promovesse infinitamente a valorização das obras de arte, uma arte pura, que reportasse grandeza cultural para os criadores e apreciadores. Lukács pretendia colocar a vida econômica a serviço da cultura e, subseqüentemente, a serviço da humanidade, ele afirmava para os sovietes que se eles se retirassem da luta econômica em prol da causa cultural, estariam promovendo uma forma de sociedade que, como ele claramente acreditava, se consolidaria no futuro.


1.2 –Cultura popular
A pronúncia do termo cultura popular em um primeiro momento já remete o interlocutor a uma espécie de cultura do povo, feita pelo povo, para o povo. Geralmente se pensa em algo de somenos importância, pelo menos do ponto de vista da elite social, partindo-se do princípio que, se parte do povo, ou seja, da massa social, não serve para a nata social que é a classe elitista dominante. Mesmo porque nas sociedades capitalistas as coisas acontecem em um sentido inverso. A moda, as gestualidades, os gostos alimentares, enfim, todos os produtos fabricados pela grande indústria da cultura, partem da elite para a população composta pelos dominados. Sendo assim, a cultura popular fica subentendida como cultura do “povão”, cultura inferior, simplória, cujo efeito só pode ser evidenciado no próprio povo devido às limitações dos próprios fabricantes e a subseqüente qualidade restrita ou praticamente inexistente dessa cultura representada nos seus produtos e rituais.
Segundo o escritor e professor de Antropologia Antonio Augusto Arantes (ARANTES, 1983: PP. 7-8) o termo cultura popular abarca uma infinidade de conceitos e concepções que vão desde a negação de que os fatos identificados nela contenham alguma forma de saber até a concepção dela como uma forma de resistência à dominação social pela classe favorecida.
Podem-se notar dois pontos de vista: de um lado um grupo de pessoas acredita não existir saber na cultura popular, para eles existe o fazer despojado da intelectualidade. Acreditam que esse tipo de cultura não traz nenhum verdadeiro enriquecimento cultural. Por outro lado, existe um grupo de pessoas que vêem na cultura popular até mesmo uma forma de contestação à dominação de classe. Percebem nessa cultura uma manifestação clara de reivindicação de direitos sociais que não são usufruídos pela classe dominada e desfavorecida. Sendo assim, o próprio povo promove a cultura popular para não ser simplesmente povo, mas acima de tudo se auto-afirmarem enquanto cidadãos, com todos os seus direitos constitucionais garantidos.
Dentro do conceito de cultura popular também existem mais dois pólos muito pertinentes à análise: O primeiro refere-se a aspectos da tecnologia que abarcam técnicas de trabalho, procedimentos de cura, etc. e de conhecimento do universo. Esse pólo está intrinsecamente respaldado no conceito de cultura proferido pelos antropólogos que compreendem a cultura como todas as ações e valores do homem dentro de uma determinada sociedade, com suas formas características de trabalho, e procedimentos convencionais, naturais ou espirituais de cura, maneiras de entender o universo, crenças e conceitos gerais referentes à religião.
O segundo pólo enfatiza as formas artísticas de expressão como literatura oral, música, teatro, etc.; sendo que os componentes do primeiro grupo pensam a cultura popular como algo pertinente ao passado, que está em progressivo estado de aniquilamento, enquanto que, os componentes do segundo pólo compreendem a cultura popular como algo voltado para o futuro e, chegam a percebê-la como mantenedora de fragmentos de uma nova forma de sociedade a ser implantada.
A cultura popular, na verdade, retrata a história do povo que a promove, mas a nomenclatura “popular” é que causa um enorme preconceito por parte dos intelectuais. Entretanto, até mesmo a classe dominante se utilizada da cultura popular, pois ao falar de um país, ainda que não se queira, trata-se de pontos ligados às raízes da nação, aqui reside preponderantemente a cultura popular. Todavia, a elite ao se utilizar de fragmentos da cultura popular procura “maquiá-los” com o objetivo de tirar-lhes o efeito ou semelhança da pobreza.


CAPÍTULO 2-HISTÓRIA DA MÚSICA BRASILEIRA E HISTÓRIA DO SAMBA

2.1 - História da música brasileira

A música brasileira, em decorrência do fato de ter um repertório bastante diversificado, é caracterizada como “fruto” de uma mistura cultural. Dessa fusão, nasce com traços específicos das muitas influências estrangeiras, o que se convencionou chamar (e eu diria que, apesar dos incidentes a serem narrados ainda neste capítulo, a classificação não é ilegítima) de música brasileira.
No início do século XVI quando os portugueses atracaram na Bahia de Vera Cruz – Porto Seguro - encontraram um povo alegre, que cantava e dançava ao som de tamboris, atabaque, palmas, e realizava cerimônias, pontuando de forma ritmada hábitos culturais que lhe eram característicos.
Mas os jesuítas, padres católicos, foram enviados da Europa, especificamente de Portugal para o Brasil com a finalidade de catequizar e civilizar os selvagens. Na liturgia da missa católica entoavam-se cânticos. Os quais foram estabelecidos como superiores às músicas e cantorias dos indígenas.
O escritor Armando de Carvalho Barros (1974: p. 993) explica o envolvimento dos índios com os padres jesuítas, inclusive na musicalidade, atentando para a tendência natural dos indígenas para a música. Os índios eram apaixonados por rituais que englobavam música e dança. Os evangelizadores europeus utilizaram a música, ainda que em ritmos diferentes e com outras mensagens para conquistar a aproximação com os selvagens e catequizá-los.
Os padres eram músicos, alguns mais aperfeiçoados, outros em menor proporção, mas, a estratégia de evangelização dos primeiros habitantes do Brasil, funcionou. As crenças católicas foram se consolidando no território brasileiro e, conseqüentemente, seus cânticos de origem européia foram sendo difundidos em detrimento da cultura musical genuinamente brasileira – os cânticos dos indígenas.


2.2 - História do Samba

A história do samba se desencadeia na cidade do Rio de Janeiro. É um legado de enorme valor cultural que pertence em um primeiro momento a esse Estado e, depois a todos os Estados nacionais.
No livro do cronista Orestes Barbosa (1978: p. 11) ele assevera que o samba se afirma na história musical do Brasil predominantemente carioca. O escritor afirma ser o samba um estilo que traduz a vida dos moradores do Rio que não são mais europeus focados em pesquisas astrológicas e científicas, mas pessoas com um perfil abrasileirado e condicionado a uma nova forma de vida.
De acordo com especialistas do samba, esse é um estilo musical que pode ser traduzido como uma janela que se abre para explicar o sentimento dos fluminenses.
Com a diversificação cultural promovida no Brasil pelos diferentes povos que imigraram na terra recém descoberta, a cultura nacional se tornou um misto de características inúmeras de diferentes nações. Mas, segundo pesquisadores da cultura brasileira, o samba se estabelece como carioca, pois, o carioca, a despeito de todas as influências sofridas pelos países europeus, foi resistente o suficiente para das misturas culturais elaborar um estilo especificamente carioca e obviamente brasileiro.
Pode-se afirmar que, pelo fato de o samba ter origem africana, no Rio de Janeiro ele foi reconhecido e aperfeiçoado e conseqüentemente consolidado como uma música carioca. Os africanos tiveram uma idéia, talvez, não tão bem definida. Com sua vinda para o Brasil eles transportaram sua música e suas formas rituais de expressão. Os demais habitantes do Brasil, europeus, índios e seus descendentes implementaram arranjos e notas musicais, aprimoraram o samba e, mediante a propagação, depois de anos de preconceito, esse estilo musical, passou a ser reconhecido e valorizado.
Pelo fato de esses acontecimentos relevantes terem acontecido no Rio de Janeiro, a origem do samba é atribuída a esse Estado. O que não deixa de ser honra ao mérito.
Orestes Barbosa (1978: p. 15) diz que para conhecer a história do samba os leitores devem passear “nos morros, nos subúrbios, nos arrabaldes, nas rampas marítimas – em todas as claridades e em todos os desvãos soturnos onde vive a alma do povo singular da cidade mais linda que o mundo tem.”
Podemos melhor entender como se fortalece e se define a música no Rio, esse estilo tão “cortejado” que se chama samba, e como se pode asseverar que ele é desse Estado brasileiro a partir das informações de estudiosos da música os quais argumentam que das diversas misturas musicais existentes no Rio, o carioca criou o samba. Barbosa (idem) fala que “o carioca é originalmente músico, desde as tabas dos seus índios.” Ele esclarece que o rio carioca que a mentalidade colonial encobriu que passa por baixo da Rua das Laranjeiras, era tido entre os tamoios como eficaz para clarear a voz dos cantores.


CAPÍTULO 3 - INDÚSTRIA FONOGRÁFICA NO BRASIL

3.1 - Conceito

A indústria fonográfica é representada por todos os agentes empenhados na produção de um trabalho artístico, como: Autores, que são os compositores das letras das músicas; Os cantores, que são os intérpretes musicais, sem as vozes dos quais não há trabalho de áudio; Os músicos-instrumentistas, que operam todos os aparelhos de som, como: Guitarra; Bateria; Percussão; Violino; Piano; Teclado; Mixers (que são as mesas de som de múltiplas entradas que permitem a utilização de vários microfones ao mesmo tempo); Tecnologia estereofônica (que é um sistema de reprodução sonora em duas vias separadas, posicionadas estrategicamente uma de cada lado do ouvinte, por meio das quais ele pode definir melhor a intensidade e qualidade dos sons emitidos); Finalização da gravação em dois canais estéreos (que é desde os anos 60 o padrão da indústria fonográfica); Afinadores eletrônicos (que são processadores em hardware e software que permitem a afinação de vozes desafinadas) e, finalmente as gravadoras, que, por sua vez concentram todos os profissionais da música em seus estúdios. As gravadoras são empresas representadas por empresários que devem obrigatoriamente possuir o CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) e Inscrição Estadual.
A produção cultural está nos estúdios, significa o talento, a voz do cantor, e, a produção comercial está nas fábricas de CDs e DVDs, é a matéria prima sendo transformada em produto de venda.
No ponto de vista de alguns críticos estudiosos da cultura, a indústria fonográfica remove o brilho da cultura, ao transformar o talento dos artistas em objeto de consumo, mercadoria.

3.1.2 - Etapas de produção

Pode-se observar que a produção material e a produção cultural são dois pólos da indústria fonográfica:

1º) Estúdios: Nos estúdios atuam músicos, compositores, produtores, intérpretes e técnicos do som, nesses ambientes, o som é o principal objeto de trabalho, o produto é a “fita master”, que é composta por todo o conteúdo musical a ser transportado para os discos.

2º) Fábricas: Nas fábricas, por outro lado, trabalha-se sobre objetos como o disco de acetato, que é transformado pelos operadores de galvanoplastia em “madre” a partir da qual os próprios fabricantes produzem as diversas “matrizes”.
As matrizes serão submetidas às prensas, onde os prensores trabalham sobre a massa de vinil, produzindo, o disco que é consumido pelo público. Depois parte-se para a última etapa no processo de fabricação, a colocação das capas e embalagem do produto.
É importante notar que a indústria do som no Brasil nasceu de forma bastante complexa, as empresas fizeram parcerias, que não foram poucas, inclusive, fusões. Um fato relevante foi a segmentação do mercado de discos, que nada mais é que uma estratégia acertada da indústria fonográfica. Os produtos começaram a ser fabricados após uma pesquisa de marketing e sob orientação dos produtores para que cada produto pudesse alcançar um público-alvo.

A antropóloga Rita Morelli (1991: p. 47) faz uma pesquisa sobre a indústria fonográfica a partir da década de 1970, que, de acordo com sua análise é o momento do boom (desenvolvimento rápido) da indústria do som no Brasil. Mas, pode-se constatar a partir da própria afirmação de Morelli que a indústria do som já vinha antes dessa época em processo de evolução, mas alcança grande projeção nesse exato período.
No final da década de 70 podíamos encontrar discos de músicos brasileiros como os do Pessoal do Ceará (Elba Ramalho, Alceu Valença, Zé Ramalho, Ednardo, Belchior e Fagner).
Podíamos também contar com uma pequena produção do rock nacional (mutantes, Rita Lee, O Terço, Casa das Máquinas); samba (o sambão-jóia, de Antônio Carlos e Jocafi, Luís Airão, Benito de Paula e os tipos-ideais do atual pagode, Os Originais do Samba) e grande fatia de música popular “romântica” (Wanderley Cardoso, Odair José, Paulo Sérgio e tantos outros).
A diversificação da produção musical possibilitou à indústria fonográfica no Brasil, em 1979 atingir o número de 64.104 milhões de unidades vendidas, dos quais é importante lembrar, 23.480 milhões eram de música estrangeira e 40.624 milhões, nacional, um número que decresceu meses depois porque da derrocada do milagre econômico. O que retrata a instabilidade da economia do país na época. Desde que o Brasil em 1979 passou a ocupar a quinta posição no mercado fonográfico mundial os números foram diminuindo crescentemente. Em 1986, o país reage, mas, de uma forma inconstante.
O panorama atual da indústria fonográfica mundial e brasileira é respaldado pela segmentação em duas principais vias de atuação:

1ª) - Trabalho com artista de catálogo: artista com um cast estável e garantido ainda que em determinados períodos obtenha vendas em menor proporção. Nos anos 70, os artistas de catálogo eram, por exemplo, os cantores da MPB dos quais muitos ainda fazem sucesso nos dias atuais e todos que vieram depois dessa década e se enquadraram nesse estilo perduram na indústria da música.

2ª) - Trabalho com artista de marketing: o artista, seu produto e todo o projeto de produção são concebidos a um baixo custo com foco na venda de milhares de cópias, mesmo que por um curto período. Temos como exemplo de artistas de marketing o grupo musical Menudos e a banda chamada Dominó.
As subsidiárias locais trabalham sob pressão das matrizes para que o percentual de lucratividade não decresça, pelo contrário, seja sempre superado, desta forma tanto estas empresas como as brasileiras são direcionadas pelas duas vias expostas.
Desde a década de 70 até o presente século XXI que acabou de começar, o Brasil atua com esta política de trabalho, ação em duas vias segmentadas. Em ambas as vias existe a influência da indústria cultural e a utilização dos recursos tecnológicos em maior ou menor proporção. Obviamente que o artista de marketing é bem mais mercadoria que o artista de catálogo, mas, ambos se submetem à utilização das técnicas da indústria fonográfica para que suas obras sejam produzidas e comercializadas.


CONCLUSÃO

Acredita-se que essa pesquisa é de fundamental importância para as faculdades brasileiras, tanto privadas como públicas, também para os profissionais do samba, cientistas sociais, músicos e a sociedade em geral, pelo fato de conter uma narração comentada e fundamentada bibliograficamente, sobre a cultura musical brasileira.
A música brasileira nasce, na verdade, com a deculturação das culturas indígena e africana, posto que, os índios que já habitavam a terra então descoberta e os negros que foram trazidos do continente africano, foram utilizados para a execução da cultura musical dos europeus em detrimento de suas culturas. Assim, a música brasileira nasce desta forma, por meio das misturas culturais, sempre com a cultura européia dita superior, sendo utilizada para sobrepor a cultura dos outros povos.
Em se tratando do samba que é um gênero da cultura brasileira, nasceu, como um estilo musical urbano, nos morros do Rio de Janeiro, mas, na Bahia, já existia o samba de roda, com a migração dos negros para o Estado do Rio, o samba começou a ser executado nas favelas. No início foi alvo de preconceito, para a classe média e rica esse estilo musical era sinônimo de pobreza e malandragem. Com o tempo, o samba começou a ser divulgado intensamente no rádio e nos palcos, surgiram sambistas como Otília Amorim, precursora do samba no palco e Mário Reis que obrigou Botafogo (que amava o samba, mas, por questão de conveniência não queria aceitá-lo) a abraçá-lo. Desta forma, por meio das exibições públicas, mediante os palcos, rádios e televisão e inserção na classe aristocrática, o samba se consolidou como um símbolo musical da cultura brasileira.
Entretanto, em 1920, por meio de uma ampla modernização no estilo, e, simultaneamente a mudança na indústria fonográfica brasileira, que deixou de usar os aparelhos mecânicos de produção e reprodução de discos pelos elétricos, o samba se transforma em produto da indústria fonográfica.
Foram acontecimentos definitivos tanto para a história da indústria fonográfica como para o samba. Com o aperfeiçoamento da forma de fabricação de discos e a modernização no samba e as novas razões que impulsionavam a execução dessa música, ela passa a ser mais um produto nas prateleiras da indústria cultural, por meio da intensa utilização dos recursos tecnológicos, subgêneros, adoção do conceito de artistas de marketing e fabricação em série com o foco totalmente voltado para a comercialização.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NETTO, José Teixeira Coelho. O que é Indústria Cultural. São Paulo: brasiliense, 2007, c 1980, 99p: Il
WIGGERSHAUS, Rolf. A Escola de Frankfurt. História, desenvolvimento teórico, significação política. Rio de Janeiro: Editora Difel, 2002, 741p
ARANTES, Antonio Augusto. O que é Cultura Popular. 5. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1983, c1981, 83p
BARROS, Armando de Carvalho. A música: sua história geral em quadros rápidos, ambientes históricos, artes comparadas. 2. Ed. Rio de Janeiro: Americana, 1974, c 1973
BARBOSA, Orestes. Samba. Sua história. Seus poetas. Seus músicos e seus cantores. 2. Ed. Rio de Janeiro: Edição
Funarte, 1978, 125p
MORELLI, Rita C. L. Indústria Fonográfica: um estudo antropológico. Campinas, São Paulo: Papirus, 1999, 231p

Nenhum comentário:

Postar um comentário